SUPERIOR TRIBUNAL MILITAR

ATA DA 62ª SESSÃO (EXTRAORDINÁRIA), EM 14 DE OUTUBRO DE 1992 - QUARTA-FEIRA

PRESIDÊNCIA DO MINISTRO GENERAL-DE-EXÉRCITO HAROLDO ERICHSEN DA FONSECA

Presentes os Ministros Paulo César Cataldo, Raphael de Azevedo Branco, George Belham da Motta, Aldo Fagundes, Luiz Leal Ferreira, Jorge Frederico Machado de Sant'Anna, Everaldo de Oliveira Reis, Cherubim Rosa Filho, Wilberto Luiz Lima, Eduardo Pires Gonçalves e José do Cabo Teixeira de Carvalho.

Ausentes os Ministros Antônio Carlos de Seixas Telles e Jorge José de Carvalho.

O Ministro Antonio Carlos de Nogueira encontra-se em gozo de férias.

Procurador-Geral da Justiça Militar, Dr Milton Menezes da Costa Filho.

Secretária do Tribunal Pleno, Drª Suely Mattos de Alencar.

Abriu-se a Sessão às 14:00 horas, sendo lida e aprovada a Ata da Sessão anterior.

Foram relatados e julgados os processos:

- APELAÇÃO 46.740-8 - RJ - Relator Ministro Jorge Frederico Machado de Sant'Anna. Revisor Ministro Eduardo Pires Gonçalves. APELANTES: O MINISTÉRIO PÚBLICO MILITAR junto à 1ª Auditoria de Exército da 1ª CJM e EUCANA DE AZEVEDO, civil, condenado a 02 anos de reclusão, incurso no art 254 do CPM. APELADA: A Sentença do Conselho Permanente de Justiça da 1ª Auditoria de Exército da 1ª CJM, de 20.05.92. Advª Drª Eleonora Salles de Campos Borges.- POR MAIORIA, o Tribunal, preliminarmente, de ofício, com fulcro no art 500, inciso I, c/c o art 504, parágrafo único, do CPPM, anulou o processo ab initio, em face da incompetência da Justiça Militar para processar e julgar o feito, determinando a remessa dos autos a Justiça Comum do Estado do Rio de Janeiro. Os Ministros RAPHAEL DE AZEVEDO BRANCO, LUIZ LEAL FERREIRA, EVERALDO DE OLIVEIRA REIS e CHERUBIM ROSA FILHO rejeitavam a preliminar.

- APELAÇÃO 46.729-7 - PR - Relator Ministro Eduardo Pires Gonçalves. Revisor Ministro Everaldo de Oliveira Reis. APELANTE: JAIR CORREA DOS SANTOS, Cb Ex, condenado a 02 meses de prisão, incurso no art 210 do CPM, com o benefício do sursis pelo prazo de 02 anos. APELADA: A Sentença do Conselho Permanente de Justiça da Auditoria da 5ª CJM, de 14.05.92. Adv Dr Edgar Leite dos Santos.- POR MAIORIA, foi rejeitada a preliminar suscitada pela Defesa, contra o voto do Ministro EVERALDO DE OLIVEIRA REIS (Revisor), que dela não conhecia. NO MÉRITO, POR UNANIMIDADE, foi dado provimento ao apelo para, reformando a Sentença a quo, absolver o recorrente, com fundamento no art 439, letra "e", do CPPM.

- APELAÇÃO 46.758-0 - RJ - Relator Ministro Aldo Fagundes. Revisor Ministro Raphael de Azevedo Branco. APELANTE: EMERSON VELASCO, Sd Ex, condenado a 02 meses e 10 dias de prisão, incurso no art 210, § 2º, do CPM, com o benefício do sursis pelo prazo de 02 anos. APELADA: A Sentença do Conselho Permanente de Justiça da 2ª Auditoria de Exército da 1ª CJM, de 26.06.92. Advª Drª Teresa da Silva Moreira.- POR UNANIMIDADE, foi negado provimento ao apelo.

- APELAÇÃO 46.776-0 - RS - Relator Ministro José do Cabo Teixeira de Carvalho. Revisor Ministro Eduardo Pires Gonçalves. APELANTE: ALEXANDRE LEMES DUARTE, Sd Ex., condenado a 04 meses de prisão, incurso no art 187 c/c 189, inciso I, ambos do CPM. APELADA: A Sentença do Conselho Permanente de Justiça da 1ª Auditoria da 3ª CJM, de 29.07.92. Advª Drª Benedita Marina da Silva.- POR UNANIMIDADE, foi negado provimento ao apelo.

A Sessão foi encerrada às 15:35 horas.

Processos em mesa:

Apel 46.546-4 (RF/ST) 1ª/3ª proc 003/91-9 Advª Benedita Marina da Silva

Apel 46.716-5 (ER/ST) Aud 11ª proc 002/92-1 Adv Alexandre Lobão Rocha

Apel 46.705-0 (ST/GB) 1ª Audex proc 001/92-5 Advª Clarice N Costa/outra

Apel 46.741-6 (LL/ST) 2ª Audex proc 012/91-7 Adv Milton Moraes Martins

(Aditamento à Ata da 62ª Sessão (Extraordinária), em 14 de outubro de 1992)

Ao início da Sessão, o Exmº Sr Ministro-Presidente assinalou a passagem, dia 9 último, da data natalícia do Ministro Eduardo Pires Gonçalves, desejando a S Exª e Exmª família, em nome do Tribunal, votos de muita saúde, paz e felicidade.

O homenageado agradeceu a manifestação.

A Seguir, o Ministro Aldo Fagundes, pedindo a palavra, fez o seguinte pronunciamento:

"Sr Presidente,

A bandeira do Brasil está a meio-mastro e de luto também estão os brasileiros. Até o clarim soa triste, no seu toque de silêncio, em memória de um grande líder.

ULYSSES GUIMARÃES é morto.

Faz algum tempo, na pregação de inadiáveis mudanças na vida do País, ele sacudiu a nação, popularizando estes versos de Fernando Pessoa: "Navegar é preciso, viver não é preciso" ...

Sua voz corajosa ecoou nas coxilhas riograndenses e nos sertões nordestinos. Esteve na Amazônia e nas cordilheiras de Minas. Andou pelas favelas e pelos campos. Esteve nas cidades e nos centros industriais. Andou pelo Brasil, como luz que orienta a caminhada de um povo e como esperança que aquece o coração, na expectativa do futuro.

Mas, sobretudo, ressoou na tribuna - a tribuna parlamentar e a tribuna que o povo levanta para ouvir os seus escolhidos, nas ruas e nas praças. De fato, a tribuna foi para ULYSSES GUIMARÃES o sonho, a luta, o amor. Foi a glória e a fé. Foi a própria vida.

Rigorosamente, a palavra foi o seu instrumento de trabalho. A palavra que ele sabia usar como ninguém. Nele, mestre consagrado da eloqüência, a palavra era, a um só tempo, bela e profunda. Falava às elites e ao povo, na linguagem que todos entendiam.

Não surpreende, por isso, que, com o passar dos anos, tenha se tornado o mais antigo Deputado do Brasil. Em 1947, foi eleito para a Assembléia Legislativa de São Paulo e, em 1950, para a Câmara dos Deputados. Desde então, não interrompeu o mandato nunca, pois o povo renovou-o consecutivamente, ao longo de doze legislaturas, a partir da Estadual, ou, para ser mais exato, 45 anos de representação parlamentar.

Nasceu em Rio Claro e era eleito por São Paulo, mas se fez o mais brasileiro de todos os membros do Congresso Nacional.

Presidiu a Câmara em diversas oportunidades e engrandeceu a Assembléia Nacional Constituinte, em 1986. Coube-lhe presidir o ato solene da promulgação do novo Estatuto Político do Brasil, em 5 de outubro de 1988, na expressão de tantas esperanças, na plenitude do estado de direito, com a ordem democrática.

Do seu vigor, do seu entusiasmo, de sua paixão, a história parlamentar do Brasil registra um fato original, um verdadeiro prefácio para a Constituição, onde ele escreveu:

"Diferentemente das sete Constituições anteriores, esta começa com o homem.

Graficamente testemunha a primazia do homem, que foi escrita para o homem, que o homem é seu fim e sua esperança. É a Constituição cidadã.

Cidadão é o que ganha, come, sabe, mora, pode se curar.

A Constituição nasce do parto de profunda crise o que abala as instituições e convulsiona a sociedade.

Por isso mobiliza, entre outras, novas forças para o exercício do Governo e a administração dos impasses. O Governo será praticado pelo Executivo e pelo Legislativo.

Eis a inovação da Constituição de 1988: dividir competências para vencer dificuldades, contra a ingovernabilidade concentrada em um, possibilita a governabilidade de muitos.

É a Constituição coragem."

Sr Presidente,

Pronuncio estas palavras com um toque especial de emoção. É que, no meu tempo de militância política, fui de ULYSSES GUIMARÃES correligionário e discípulo. Convivi com ele e servi-o como assessor, em momento especial de minha vida pública. O que digo, pois, é fruto de alma e sentimento. É testemunho público. É lembrança de diálogos e ensinamentos.

Do seu conceito de Política, por exemplo, não vou me esquecer, pois valia ontem, vale hoje e vale para sempre:

"Política não é técnica. É a captação do possível, o recenseamento das circunstâncias, a atrevida semeadura de conquistas futuras, o consórcio da lógica com a imaginação, o convênio da razão com a utopia, o risco de prever para prover, a consciência de que não é o poder que corrompe o homem, mas é o homem quem corrompe o poder. É, enfim, a trabalhosa e fascinante busca da verdade, pela meditação, pelo estudo, pela discussão, pela persuasão, pela transigência, e pela resistência".

Eis, assim traçado, Sr Presidente, um rápido perfil do notável Político, cuja memória enalteço, neste voto de pesar.

Administrador de crises e indicador de soluções e rumos, ele se tornou o artífice maior da obra de engenharia política, que tem sido a construção do Brasil contemporâneo. Organizado, sabia distribuir bem o tempo, para produzir, afirmando sempre a supremacia do trabalho. É ilustrativo este pensamento dele: "Dizem que tenho estrela, mas, por segurança, eu a lustro diariamente, a partir das seis da manhã, para que brilhe".

É difícil lamentar a sua perda sem repetir o óbvio. Mas conforta sentir que, se o Congresso Nacional não tem mais a sua presença, o seu talento, a sua energia, a sua voz, o seu gênio criador, o Brasil e os brasileiros tem o seu exemplo. Seu nome é legenda e sua vida pública é inspiração.

Rendo minhas sentidas homenagens, também, Sr Presidente, à memória de sua mulher, solidária na vida e na morte, Dona Mora, bem como aos seus amigos e companheiros na tragédia, o eminente Senador Severo Fagundes Gomes e sua esposa, Dona Henriqueta Marsiaj Gomes.

São estas, nobres Srs. Ministros, as palavras do meu pesar, que peço serem transcritas na ata da sessão de hoje. Um momento de saudade e reflexão, na exaltação da memória de um grande brasileiro.

ULYSSES GUIMARÃES, homem de Estado, com o nome definitivamente inscrito na História.

ULYSSES GUIMARÃES, um lider que usou o tempo que lhe foi concedido a serviço do povo, na defesa dos valores que permanecem: a JUSTIÇA e a LIBERDADE!"

A Presidência, em nome da Corte, associou-se à manifestação de pesar.

Também o MPM, na pessoa de seu representante máximo, Dr Milton Menezes da Costa Filho, sobre o infausto acontecimento assim se expressou:

"O MPM jamais poderia ficar silente diante de tão marcante acontecimento. Perde a Nação um dos seus últimos estadistas do período moderno.

Contudo, ele não morreu; deixou, apenas, esta vida temporal para brilhar na eternidade de nossa História, como exemplo marcante para os pósteros.

Este Procurador-Geral, em época remota, teve oportunidade de contatos com ULYSSES GUIMARÃES. Posições antagônicas nos encontrávamos. E só nos embates é que se conhece os gigantes, cuja ausência, é sempre marcada pelo clarão maior que deixa com o seu afastamento. Naqueles momentos, se aquilatou toda a sua coragem, todo o seu denodo na defesa da causa que, no seu entender, se apresentava justa e grandiosa para a sua Pátria.

As nossas condolências à sua família e os votos sentidos ao País que o perde."