ATA DA 65a. SESSÃO, EM 7 DE OUTUBRO DE 1 959.

PRESIDÊNCIA DO EXMO. SR. MINISTRO ALMIRANTE OCTÁVIO MEDEIROS.

PROCURADOR GERAL DA JUSTIÇA MILITAR, O EXMO. SR. DR. IVO D’AQUINO FONSECA.

SECRETÁRIO, O SR. DR. IBERÊ GARCINDO FERNANDES DE SÁ.

Compareceram os Exmos. Srs. Ministros Dr. Vaz de Mello, Dr. Murgel de Rezende, Gen. Alencar Araripe, Gen. Falconieri da Cunha, Dr. Autran Dourado, Brig. Álvaro Hecksher, Dr. Adalberto Barretto, Almte. José Espíndola, Brig. Vasco Alves Secco e Gen. Daudt Fabrício, ministro convocado.

Acha - se licenciado, o Exmo. Sr. Ministro Gen. Lima Câmara.

Às treze horas, havendo número legal, foi aberta a sessão.

Lida e sem debate, foi aprovada a ata da sessão anterior.

Oração proferida pelo Exmo. Sr. Ministro Dr. Adalberto Barretto, na sessão do dia 5 de outubro, por ocasião da homenagem prestada pelo Tribunal ao inesquecível jurista Dr. Clóvis Beviláqua, ao esnsêjo do centenário de seu nascimento:

“Senhor Presidente, VIDA E OBRA DE CLÓVIS BEVILÁQUA, EM LIGEIROS TRAÇOS, Nasceu Clóvis Beviláqua, em modesta cidade cearense, Viçosa, a 4 de outubro de 1859. Estamos, assim, dentro do mês e ano do centenário de seu nascimento. Fêz êle os seus estudos secundários na Capital do Estado, completando - o no Rio de Janeiro. Foi, porém, em Recife, que deu largas à sua ânsia de saber. No Ceará, ainda bem jovem, dedicou - se à leitura dos escritores em voga: Gonçalves Dias, Fagundes Varela, Alencar, Álvaro de Azevedo e Castro Alves, engolfando - se na poesia e no romance. Penetrou, depois mais em cheio, na literatura, ao lado de Rocha Lima, Capistrano de Abreu, Araripe Júnior, João Lopes, Amaro Cavalcante e Tomaz Pompeu Filho, chegando mesmo a enamorar - se da crítica literária. Integrava a “Academis Francesa do Ceará”, título que deu Rocha Lima ao movimento literário, àquela época, em 1875. Foi, cada vez mais, aprofundando - se em develados estudos. Nesta Capital, e, principalmente, Recife, dedicou - se às doutrinas filosóficas através de Augusto Conte, Litré, Spencer, Haeckel, Lange, Soury, Wundt e outros. A famosa “Escola do Recife” teve grande influência, na formação cultural de Clóvis Beviláqua. Acompanhou êle tôdas as suas fases: desde a de sua atividade criadora – da poesia, à de sua maturidade – de crítico - filosófica e jurídico - filosófica (1878) Formado, em direito, pela Faculdade de Direito de Recife, em 1882, exerceu, em seguida , o cargo de Promotor Público, no Estado do Maranhão, passando, um ano depois, ao de bibliotecário daquela Faculdade. Foi lente de filosofia, no seu Curso Anexo, entrando, em 1891, com 32 anos, para seu corpo docente, como catedrático de Legislação Comparada. Representou o Brasil, por mais de uma vez, no Tribunal de Haya. Foi consultor jurídico do Ministério das Relações Exteriores, por dilatados anos. Recusou a nomeação de Ministro do Supremo Tribunal Federal. Pertenceu à Academia Brasileira de Letras, desde a sua fundação, e a Associações Científicas, nacionais e estrangeiras. Teve seu nome incluído no Livro do Mérito. A sua bibliografia e opulente. Citemos apenas alguns de seus trabalhos, Filosofia Positiva no Brasil, Estudos de Direito e Economia Política, Legislação Comparada, Direito de Sucessões, Projeto do Código Civil Brasileiro, Unidade de Direito Processual, Direito Internacional Privado, Teoria Geral do Direito Civil, Direito Público Internacional e muitas outras obras sôbre história, conto, biografia e literatura, pròpriamente dita.

Seu Projeto de Código Civil, afinal transformado em lei, no ano de 1916, imortalizou - o, nas letras jurídicas. Duramente combatido, Clóvis Beviláqua teve de sustentar renhidas polêmicas em defesa de seu trabalho. Contou com adversários do estôfo de Andrade Figueira, Coelho Rodrigues e Rui Barbosa. “Depois de concluído meu curso de direito, escreveu Clóvis Beviláqua, foi que, por assim dizer, comecei a interessar por essa bela ciência, ao lado da qual passara cinco anos sem lhe perceber encantos. Devo a Tobias Barretto êsse inestimável serviço de me ter aberto a inteligência para ver o direito. Durante o curso acadêmico estudei, apenas, para cumprir as minhas obrigações e transitar pelas solenidades escolares sem apôio estranho; mas não podia dedicar afeição profunda a uma ciência na qual não descobria o influxo das idéias que me davam a explicação do mundo. Incitado pelo ensino de Tobias e guiado por Lhering; vi o direito à luz da filosofia, da sociologia e da história. Savigny, Bluntschli, Roth, Classon, Cimbali, d’Aguano, Cogliolo e Post, para citar sòmente os mais característicos, deram - me a educação jurídica. No direito penal, as minhas simpatias se declararam, desde os primeiros momentos, pela “terza scuola” de Tarde, Alimena e Liszt. Mas ainda qua a história e a legislação comparada me dessem a contemplação do fenômeno jurídico no seu máximo briho e em sua plenitude, é bem de ver que eu não me podia segregar do direito pátrio, cuja expressão me devam, principalmente, Coelho da Rocha, o mais completo discípulo de Mélo Freire, e Teixeira de Freitas, o maior dos nossos jurisconsultos.”

COLABORAÇÃO DE CLÓVIS BEVILÁQUA NA REVISÃO DA LEI PENAL E DISCIPLIONAR MILITAR, HÁ QUASE MEIO SÉCULO ATRÁS.

Depois dêstes ligeiros traços da vida de Clóvis Beviláqua, dos quais, não obstante, se projetam, sem sombra de dúvida, o notável escritor, festejado sociólogo e grande jurista, dentro e fora do país, vamos, agora, nos deter, ainda que perfuntòriamente, na apreciação dos trabalhos – ESBOÇO DO CÓDIGO PENAL e ESBOÇO DO CÓDIGO DISCIPLINAR, ambos para a Armada Brasileira, por dizerem bem de perto, tais obras, com ramo de direito de nossa especialidade. Ditos trabalhos foram tidos, ao seu tempo, por quem podia fazer, o douto mestre Esmeraldino Bandeira, de saudosa memória, como dos melhores no seu gênero, em condições de servirem preferencialmente, de base aos trabalhos de reforma de nossa legislação penal e disciplinar.

Surgiram os ESBOÇOS de Clóvis Beviláqua, em consequência dos graves acontecimentos de 1910, conhecidos como revolta dos marinheiros, chefiada por João Candido, de triste memória, quando, então, foi posta, em foco, na Câmara Alta, pelo Senador Rui Barbosa, a nossa “ancrônica e retrógada” legislação penal e disciplinar, resultando a apresentação, em fins daquele ano, de sua indicação ao Senado, no sentido de qua a Comissão de Justiça e Legislação, juntamente com a do Constituição e Diplomacia, tomando em consideração as sobreditas leis e ouvindo sem demora o Govêrno da República, sôbre o lado prático do assunto, formule e submeta ao Congresso, a tempo de se discutir e votar, na corrente sessão legislativa, um projeto que, extinguindo inteiramente os castigos corporais no Exército e na Armada, estabeleça meios de repressão eficaz ás transgressões dessa medida.”

Confiou, então, o Govêrno, ao gênio e saber de Clóvis Beviláqua, a elaboração de um Projeto de Código Penal para a Armada, compreendendo não só o regime de repressão dos crimes, como também o das contravenções de ordem disciplinar, “calcado nos princípios liberais decorrentes da forma republicana, concedida em sua mais alta acepção” – dizia o convite, firmado pelo ilustre Ministro da Marinha, Almirante Joaquim Marques de Leão. Acrescentavam, ainda, que o nome de Clóvis Beviláqua, para auxiliar o govêrno em tão espinhosa e patriótica tarefa, constituia a plena justificativa da escolha. Meteu mãos à obra o insigne mestre, dando, no curto prazo de poucos meses, em julho de 1911, os ESBOÇOS DE CÓDICOS solicitados, em cujo trabalho, prestou apreciáveis esclarescimentos e mencionado titular da Pasta da Marinha, em brilhante exposição que lhe fêz sôbre o assunto.

EXAME DO ESBOÇO DO CÓDIGO PENAL PARA A ARMADA BRASILEIRA.

Na sua EXPOSIÇÃO de MOTIVOS do ESBÔÇO DO CÓDIGO PENAL PARA A ARMADA BRASILEIRA, presta o eminente jurista Clóvis Beviláqua, os seguintes esclarecimentos preliminares: “I) Antecedentes – Necessidade de Reforma. II) Especialixação do Direito Penal Militar. III) Conceito di Direito Penal Militar. IV) Plano adotado. V) Da lei Penal Militar e da sua aplicação. VI) Das penas e dos seus efeitos. VIII) Confronto entre o Esbôço de projeto e o Código Penal Militar em vigor”

Mostra ser óbvia a reforma proposta. Como argumento à imprestabilidade da legislação militar – criminal e disciplinar, de então, adota o surpreendente pensamento do ilustre Almirante Ministro da Marinha Marques de Leão, de que “a observância, absoluta das nossas leis militares só nos levará ao que temos chegado, pois os males presentes não decorrem da inobservância das leis : originam - se delas mesmas.”

Atacou de frente o momentoso problema “de face dupla”, como declara o sábio e mestre: a legislação penal militar ao lado da legislação penal comum, e a autonomia na organização da justiça penal militar. Seus argumentos, em favos da especialização do direito penal militar e da autonomia da justiça militar, são convincentes. É mátéria constitucional, de ôntem e de hoje, acrescenta, pr último, Clóvis Beviláqua.

Do estudo aprofundado que fêz dos delitos militares, houve, por bem, distribuí - los em três grupos: 1°, crimes essencialmente militares; 2°, crimes militares por compreensão normal da função militar, 3° crimes acidentalmente militares.

O plano do ESBOÇO, declara o notável jurista, obedeceu a duas idéias diretores: a) não articular senão delitos militares; b) considerando o direito penal militar uma especialização do comum, não incluirn no respectivo Código, os princípios gerais, cujo lugar próprio é na Código comum, exceção daqueles preceitos em que o direito especial modificar o comum.

Não foram, porém, adotados, em projetos posteriores, tais diretrizes, a não ser no Projeto chamado Marques de Leão, que foi calcado no Esboço Clóvis Beviláqua. O nosso Código Penal vigente, de 1944, como sabemos, não seguiu tal orientação, como não a seguiu o Código anterior, de 1891.

Separou o ESBOÇO, nítidamente,as disposições destinadas ao estado de paz e as destinadas especialmente ao estado de guerra, como o faz presentemente o nosso Código, e não o fazia do Código passado.Não tiveram ingresso, no ESBOÇO, os crimes políticos, como acontecia no Código anterios, pela razão de não serem consideradas militares. Assim justificada seu ponto de vista o autor: “Os militares quando delinquem polìticamente não atentam contra as condições de vida ou contra os meios de ação do Exército ou da Armada, não cometem um crime funcional; agem como cidadão ativo que deliberam, seja destruir ou alterar a organização constitucional do país, seja impedir o livre exercício dos pederes políticos.

Se, para atingirem os seus fins, rompem com a disciplina, êste fato, então acidental, é secundário, é absorvido pela predominância do fato substancial e principal.”

Seguiu igual orientação o Código vigente. O parágrafo único do art. 10 do ESBOÇO, esclarecendo o que se devia estender por “tempo de guerra” para efeito do Código, equiparou a “guerra externa” a “comoção interna” o que talvez encontrasse justificativa, àquela época. Ressalvou, porém, que a pena de morte sòmente seria aplicável em caso de guerra internacional, e, mesmo assim, em casos muito reduzidos. O ESBOÇO apenas recorreu à intimidação pelo fuzilamento em sete casos: em três modalidades do crime de traição, duas de cobardia, uma de sublevação e uma de motim, enquanto que o Código de 1891, em doze disposições contém a pena letal, e o vigente, em número muito maior.

Cuidou com desvêlo, o eminente mestre, da aplicação da pena, deixando esboçado em seu trabalho, a sua INDIVIDUALIZAÇÃO, tão preconizada em nossos dias. Declara êle: “Diferenciem - se os crimes o especializem - se as penas.” Consagra, no ESBOÇO, o Instituto do Livramento Condicional, êsse “invento feliz da penalogia”, no seu dizer, declarando que “não há motivo particular, para não se usar, no direito penal militar, dêsse meio de individualização da pena e de socialização dos delinquentes adaptáveis.

Em boa hora, foram transportados, em definitivo, do Código Penal Comum para a atual Código Pena Militar, de 1944, os Institutos da Individualização da Pena e do Livramento Condicional.

O ESBOÇO, suprindo lacuna do Código anterior, fêz a distinção entrea sublevação e o motim, criando uma ficura nova, menos grave, o levante sem armas (art. 33). O Código vigente, sob a denominação de revolta e motim, admite o levante, com armas e sem armas, dando maior desenvolvimento a matéria.

Disciplinou o trabalho de Clóvis Beviláqua, melhor do que o Código anterior, o crime de deserção, declarando que o conceito da deserção não abrange certas faltas involuntárias, como, v.g., a perda do navio em determinadas condições (art. 57 parágrafo único) e individualizando, por assim dizer, a pena segundo a gravidade dos casos (art. 57).

Incontestàvelmente a matéria, em nosso Código, vem melhor tratadas, embora se ressinta ainda de falhas e omissões.

O ESBOÇO cuida , de maneira especial, do crime de espionagem: desvia - se do estabelecido no direito pátrio anterior e da maioria da legislação estrangeira. Quando por militar é pura e simplesmente uma das formas que pode revestir a traição, e como tal, deve ser capitulada; quando praticada por estranho ao serviço militar, deixa de ser um delito especial de função, para entrar na esfera dos atos punidos pelo Código Penal Comum.

Em suma: O ESBOÇO remete o militar convencido de espionagem, que revela os segredos militares ao inimigo, para o dispositivo penal revela militar que comina pena aos traidores, e os estranhos ao serviço militar, à autoridade civil. Não há espionagem em tempo de paz.

Não se justifica, por certo, tal doutrina, no século atual, em que a guerra e a segurança nacional, apresentando - se com outras características, complexas e transcedentais, estão a exigir medidas mais condizentes, com a realidade dos fatos.

Mas o grande mestre esboçou um Código Penal Militar, há quase meio século atrás, quando ainda não se falava em guerra total, em esputinique nem ocupação planetária...

EXAME DO ESBOÇO DO CÓDIGO DISCIPLINAR PARA A ARMADA BRASILEIRA.

Na EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS explica Clóvis Beviláqua a razão de ser da denominação de Código Disciplinar para a Armada Brasileira. Para o Exército, há um Regulamento é a denominação adotada em Portugal. Código, porém, é a designação que encontrou para o corpo de disposições disciplinares da Armada; conserve - se, assim, a tradição.

A matéria do ESBOÇO do Código Disciplinar, declara Clóvis Beviláqua, pouco difere da que faz objeto do Código Disciplinar então vigente. O seu espírito, porém, é outro. A forma e a coordenação jurídica obedecem, também, a moldes diferentes. Teve - se, como indispensável “a necessidade de determinar a discriminação das contravenções em espécie e as circunstâncias das faltas, pois que o Código Disciplinar da Armada se resumia em rol de penas e contravenções”,

Algumas punições desapareceram do quadro das correções disciplinares. Os castigos corporais já se acham, de fato, abolidas e sàbiamente substituidos pela transferência dos incorrigíveis para a Colônia Correcional de Dois Rios – assinala a ESPOSIÇÃO DE MOTIVOS. Condenando a golilha, estabelece Clóvis Beviláqua, os verdadeiros fins da pena disciplinar, “que se resumem na adaptação do infrator à ordem jurídica dominante, pela compreensão dos deveres e pelo estabelecimento do respeito, que deve ser um sentimento simpático sugerido pelo reconhecimento da superioridade hieráquica, e não um movimento emocional depressivo, onde haverá sempre, um sentimento de antipatia.”

“A prisão com excesso de rigor, também é contraproducente. A admoestação não é, pròpriamente, uma pena: é, apenas um conselho dado com autoridade, e, revestindo essa forma, há de ser mais fecunda em resultados, porque, suscitando sentimentos benévolos, condizirá, fàcilmente os espíritos para os fins a que a disciplina os encaminha.”

No Código Disciplinar então para vigente, havia uma rudimento de recursos contra as punições injustas. Desenvolveu - se êsse pensamento, deuse - lhe corpo e organização para que, melhor, correspondesse à necessidade moral de justiça, de que a sociedade moderna é a vida, o serviço de estímulo aos aplicadores da lei, na primeira instância.”

“Teve o cuidado o ESBOÇO de prescrever regras, para a aplicação das penas, com a clara intenção de oferecer pontos de apôio, esclarecimentos e orientação aos que, por dever ofício, tem de julgar das intenções dos outros pelos atos, e reprimir êstes, quando perturbadores da disciplina.”

As penas disciplinares ficaram reduzidas: para oficiais, a repreensão, detenção até oito dias e a prisão simples, pelo mesmo prazo; para inferiores, a repreensão, serviço dobrado, impedimento até trinta dias, desconto na gratificação até um têrço da importância mensal, prisão simples até oito dias, baixa temporária de pôsto, não excedendo de dois meses, baixa indefinida de pôsto e transferencia para a Colônia Correcional de Dois Rios; e para cabos, marinheiros e soldados, as mesmas acima, salvo a de desconto de gratificação, substituida pela faxina (art.3°)

Mostrou - se o grande mestre à altura de sua delicada missão. Quase meio século passado, e em nada ou quase nada se alterou a sua orientação na aplicação da pena: “adaptação do infrator à ordem jurídica dominante, pela compreensão dos deveres e pelo estabelecimento do respeito, que deve ser um sentimento simpático sugerido pelo reconhecimento da superioridade hierárquica e não um movimento emocional depressivo, onde haverá, sempre, um sentimento de antipatia” – repete - se.

Não é outra orientação atual dos nossos regulamentos, sintetizada na forma: Tão nobre obedecer como mandar.

Os dois ESBOÇOS de Clóvis Beviláqua , a que vimos fazendo despretenciosas considerações, foram inspirados na Codificação Militar Holandeza, a mais moderna de então. Contém, não obstante, algo de novo, para aquela época, e muito do seu autor. “Fêz o eminente jurisconsulto – conforme o Ministro Gomes Carneiro – magnífica obra pessoal, interpretando a nossa lei fundamental e as tradições do nosso direito.”

PROJETOS DE CÓDIGO PENAL E CÓDIGO DISCIPLINAR DA ARMADA DO ALMIRANTE MARQUES DE LEÃO.

Calcados nos aludidos ESBOÇOS, foram compostos, no Ministério da Marinha, dois Projetos de Código: Penal e Disciplinar para a Armada. Apresentados ao Presidente da República, Marechal Hermes da Fonseca por seu Ministro, Almirante Marques de Leão, encaminhou - os, acompanhados de longa EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS, ao Congresso Nacional. Atribui - se ao Auxiliar de Auditor da Marinha Oscar de Macedo Soares, a autoria de tais projetos, aliás, como já se disse, calcados nos ESBOÇOS de Clóvis Beviláqua.

Não obstante as considerações finais da Mensagem do Govêrno, datada de 29 de dezembro de 1911, que encaminhava ditos projetos ao Congresso, acentuar que “devido à magnitude do assunto ao qual estão presos os interêsses da maior relevância para a Armada Nacional, não era preciso encarecer a urgência de que mesmo necessita”, permaneceram êles ali, sem andamento, como tantos outros projetos do mesmo gênero.

Esclarece o Ministro Gomes Carneiro que “não fôsse a campanha que a reforma da justiça militar suscitou na Câmara, ~no ano de 1912, e não seriam conhecidos da Nação, os trabalhos que, para a revisão da lei penal e disciplinar militar, fizera o insigne Clóvis Beviláqua.”

Mais tarde, em 1917, por ocasião da discussão, no Senado, do Projeto de Códito Penal Militar, da autoria do Senador Cunha Pedrosa, vêm novamente à balha os sobreditos ESBOÇOS e PROJETOS, a respeito dos quais faz as melhores referências aquele Senador. Declara se ter servido, na elaboração de seu trabalho, de modo especial, do ESBOÇO de Clóvis Beviláqua e respctivo Projeto tido como de Almirante Marques de Leão.

Prosseguindo nos seus trâmites, o Projeto do Senador Cunha Pedrosa, é considerado, em 1920, por uma Comissão Especial do Senado, em condições “de servir de base à discussão”. Afinal, depois de se haverem manifestado a respeito Associações e especialistas na matéria, recebe o mencionado Projeto, no mesmo ano de 1920, novo parecer da referida Comissão, nela permanecendo, nestas condições, até hoje, ao que nos parece.

Assim, o destino dos ESBOÇOS de Clóvis Beviláqua : Vividos nos PROJETOS do Almirante Marques de Leão ou do Auditor Oscar Macedo Soares, e revividos no Projeto do Senador Cunha Pedrosa, ficaram , em última análise, confinados no Congresso Nacional. Todavia não se pode negar o serviço que prestou o notável jurista às letras jurídicas militares, com os seus ESBOÇOS, e o rastro de luz que êle deixou através dos mesmos.

Ainda recentemente, no I Congresso Jurídico de Direito Militar, realizado no ano passado, foi a sua obra lembrada : consultada e discutida.

COLABORAÇÃO DE CLÓVIS BEVILÁQUA, EM 1942, PARA A REVISÃO DO CÓDIGO DA JUSTIÇA MILITAR.

Não podemos deixar, nessa oportunidade, de fazer referência, embora ligeira, ao notável e paciente trabalho que escreveu Clóvis Beviláqua, no ano de 1942. do próprio punho, em 44 páginas cheias, em bom cursivo respondendo a dez questionários que lhe foram apresentados, visando - se à revisão do Código da Justiça Militar, como se vê da revista ARQUIVO DE DIREITO PENAL MILITAR – Ano I – Setembro a dezembro de 1942 – N° 2 – Páginas 235 a 259, nela reproduzidas em fac - símile.

E mais um serviço do ilustre patrício às letras jurídico - militares, e um documento que há de passar à História.

CLÓVIS BEVILÁQUA, SUA PROFISSÃO DE FÉ – CREIO ..., COMO REMATE.

Como remate ao nosso trabalho, não temos outras palavras senão as que ora tomamos por empréstimo ao eminente brasileiro Clóvis Beviláqua, da sua Profissão de Fé – Creio ..., de tão alta significação cívica, jurídica, moral e filosófica.

Crê êle no DIREITO, porque é a organização da vida social, a garantia das atividades individuais ...

Crê êle na MORAL, porque é a utilidade de cada um e de todos transformada em justiça e caridade ...

Crê êle na JUSTIÇA, porque é o direito iluminado pela moral ...

Crê êle na DEMOCRACIA, porque é a criação mais perfeita do direito político, em matéria de forma de govêrno ...

Mas crê êle, “ainda mais, nos milagres do patriotismo, porque o patriotismo é forma social do amor, e, como tal, é fôrça irresistível e incomensurável : aos fracos dá alento, aos dúbios decisão, aos descrentes fé, aos fortes ilumina, a todos uno num feixe indestrutível, quando é preciso agir ou resistir; não mede inspiração do ódio e não mede sacrifício para alcançar o bem comum.”

Fôram, a seguir, relatados e julgados os seguintes processos:

H A B E A S = C O R P U S

N° 26.137 – Cap.Fed. - Rel. - O Sr Ministro Dr. Murgel de Rezende. - Paciente: Delphino Francisco de Oliveira, soldado do Depósito Central de Armamento, pede licenciamento das fileiras do Exército, sem prejuízo do processo a que responde. - Denegaram a ordem, contra os votos dos Exmos. Srs. Ministros Dr. Murgel de Rezende, Gen. Falconieri da Cunha e Brig. Alves Secco, que concediam. -

N° 26.140 – Cap.Fed. - Rel. - O Sr. Ministro Gen. Falconieri da Cunha. - Paciente: Ascendino Ferreira, soldado do Depósito Central de Armamento, pede para ser licenciado das fileiras do Exército, sem prejuízo do processo do qual foi absolvido pelo Conselho Permanente de Justiça da Segunda Auditoria da Primeira Região Militar. - Denegaram a ordem, contra os votos dos Exmos. Srs. Ministros Gen. Falconieri da Cunha, Dr. Murgel de Rezende e Brig. Alves Secco, que a concediam. -

N° 26.141 – Cap.Fed. - Rel. - O Sr. Ministro Dr. Autran Dourado. - Paciente: Afonso Larroca e Dante Horácio Gomes Cyrillo, civis, que se acham presos na Delegacia de Roubos e Falsificações, pedindo serem postos em liberdade. - Denegada a ordem, por falta de objeto, unânimemente. -

N° 26.142 – Cap.Fed. - Rel. - O Sr. Ministro Gen. Falconieri da Cunha. - Paciente: Luiz Antônio de Oliveira, taifeiro, prêso no Presídio Naval, à disposição da Justiça Militar, pedindo ser pôsto em liberdade. - Concederam a ordem, sem prejuízo do processo, unânimemente. -

CORREIÇÃO PARCIAL

N° 633 - R.G. do Sul. - Rel. - O Sr. Ministro Brig. Álvares Hecksher. - O Dr. Promotor da 3a. Aud. Da 3a. R.M., com fundamento no art. 367 do C.P.M., requer Correição Parcial nos autos do processo de insubmissão de Flores de Bone, soldado do 17° R.I., para serem corrigidas irregularidades nos referidos autos. - Deferiram a Correição, unânimemente. -

RECURSOS CRIMINAIS

N° 3.817 – São Paulo. - Rel. - O Sr. Ministro Dr. Adalberto Barretto. - Recorrente: A Promotoria da 1a. Auditoria da 2a. R.M.. - Recorrido: O despacho do Dr. Auditor que entendeu tratar - se de transgressão disciplinar os fatos apontados ao indiciado 3° sargento da Aeronáutica João José Ferreira de Souza, servindo na Escola de Oficiais Especialistas e de Infantaria de Guarda. - Negaram provimento ao recurso, mantendo o despacho recorrido, sem prejuízo da ação administrativa ou disciplinar, unânimemente. -

N° 3.812 – Pará. - Rel. - O Sr. Ministro Dr. Autran Dourado. - Recorrente: A Promotoria da Auditoria da 8a. R.M.. - Recorrrido: A decisão do Conselho Permanente de Justiça da Auditoria da 8a. R.M., que julgou incompetente a Justiça Militar para julgar o I.P.M., no qual é indiciado o soldado da 3a. Companhia de Fronteiras, Cícero Pereira da Penha. - Acolhida a preliminar de se conhecer do recurso, unânimemente. - No mérito, lhe deram provimento julgando competente a Justiça Militar, contra os votos dos Exmos. Srs. Ministros Dr.Vaz de Mello, Dr. Murgel de Rezende e Gen. Alencar Araripe, que votavam pela incompetência. -

A P E L A Ç Õ E S

N° 31.026 – Paraná. - Rel. - O Sr. Ministro Brig. Alves Secco. - Rev. - O Sr. Ministro Dr. Autran Dourado. - Apelante: Lauri de Olveira, soldado do 2° Batalhão Rodoviário, condenado a sete meses de prisão, incurso no art. 163 do C.P.M.. - Apelado: O Conselho de Justiça do 2° Batalhão Rodoviário. - Provida, em parte, reduziram a pena a 6 meses de prisão, unânimemente. - Não tomou parte no julgamento, o Exmo. Sr. Ministro Gen.Alencar Araripe, por não ter assistido o relatório. -

N° 31.021 – Cap.Fed. - Rel. - O Sr. Ministro Dr. Murgel de Rezende. - Rev. - O Sr. Ministro Brig. Alves Secco. - Apelante: Jurandir Donatti, GR - SC. - 56.5028.3, condenado a sete meses de detençao, incurso no art. 136 do C.P.M.. - Apelado: O Conselho Permanente de Justiça da Primeira Auditoria da Marinha. - Negaram provimento, confirmando a sentença, unânimemente. -

N° 30.974 – Cap.Fed. - Rel. - O Sr. Ministro Dr. Murgel de Rezende. - Rev. - O Sr. Ministro Gen. Falconieri d a Cunha. - Apelante: A Promotoria da Segunda Auditoria da Marinha. - Apelado: Jorge Azevedo da Rocha Paranhos, capitão de corveta, absolvido dos crimes previstos nos arts. 181, §§ 3° e 4° e 182 §§ 5° e 6°, c/c a primeira parte do art. 66 § 1° e com o art. 59, n° II, letra “k”, tudo do C.P.M.. - (Julgamento em sessão secreta). -

N° 31.046 - São Paulo. - Rel. - O Sr. Ministro Dr. Vaz de Mello. - Rev. - O Sr. Ministro Gen. Alencar Araripe. - Apelante: A Promotoria da Segunda Auditoria da Segunda Região Militar. - Apelado: Eduardo Ferrari, secretário da junta de Alistamento Militar da comarca de Bariri, absolvido do crime previsto no art. 232 do C.P.M.. - (Julgamento em sessão secreta). -

No início da sessão, o Exmo. Sr. Ministro Dr. Vaz de Mello, pedindo a palavra, pela ordem, expressou sua profunda tristeza pelo falecimento do Exmo. Sr. Ministro Bento de Faria. Teceu S.Excia. comentários sôbre a personalidade do ilustre jurisconsulto, autor de consagradas obras de direito e que exerceu, entre outros cargos de relêvo, o de Presidente do Supremo Tribunal Federal. Propôs S.Excia. constasse em ata um voto de profundo pesar pelo doloroso acontecimento, com homenagem dêste Tribunal ao Ministro Bento de Faria e que se oficiasse ao Exmo. Sr. Dr. Edmundo Bento de Faria, filho do ilustre extinto e ao Exmo. Sr. Presidente do Supremo Tribunal Federal, comunicando - lhes dita homenagem.

O Exmo. Sr. Dr. Ivo d’aquino Fonseca, Procurador Geral, em seu nome e no do Ministério Público, associou - se à homenagem prestada.

Submetida a proposta á votação, foi a mesma aprovada, unânimemente. -

Foi, a seguir, encerrada a sessão.

Acham - se em mesa, os seguintes processos:

Apelações: 31.049 (DF/AD) 31.050 (AA/AD) 31.040 (AS/VM)

31.014 (MR/JE) 31.048 (AS/AB) 31.085 (AA/AD)

31.053 (FC/MR) 30.989 (MR/AH)

Embargos: 30.884 (VM/AA)

Revisões Criminais: 870 (MR/AA) 872 (AD/AH) 829 (AB/AH)

Recursos Criminais: 3.810 (MR) 3.813 (MR) 3.814 (AB)