SUPERIOR TRIBUNAL MILITAR

ATA DA 3a. SESSÃO, EM 30 DE MARÇO DE 1970 .

PRESIDÊNCIA DO MINISTRO TENENTE- BRIGADEIRO ARMANDO PERDIGÃO

PROCURADOR-GERAL DA JUSTIÇA MILITAR: DR NELSON BARBOSA SAMPAIO

SECRETÁRIO: DR CLÁUDIO ROSIÈRE, VICE-DIRETOR-GERAL

Compareceram os Ministros Waldemar de Figueiredo Costa, Gabriel Grün Moss, Francisco de Assis Corrêa de Mello, Octacílio Terra Ururahy, Alcides Vieira Carneiro, Sylvio Monteiro Moutinho, Eraldo Gueiros Leite, João Mendes da Costa Filho, Mário Cavalcanti de Albuquerque, Adalberto Pereira dos Santos, Álvaro Alves da Silva Braga, Waldemar Tôrres da Costa, Jurandyr de Bizarria Mamede e o Ministro convocado G.A. de Lima Tôrres.

Às 13 horas, havendo número legal, foi aberta a sessão.

Lida e sem debate, foi aprovada a ata da sessão anterior.

Apelação julgada em sessão secreta, no dia 25 do corrente mês

37 490 - Rio Grande do Sul. Relator: Ministro Alcides Carneiro. Revisor: Ministro Sylvio Moutinho. Apelante: A Procuradoria Militar da 3a.Aud/3a. RM. Apelada: A Sentença do CPJ da 3a.Aud/3a. RM, de 11.7.969, que absolveu EPAMINONDAS SILVEIRA, TASSO SOARES PEREZ e NERCIO ALVES DE OLIVEIRA, civis, do crime previsto no art 24 da Lei 1802/53. - Por unanimidade de votos foi negado provimento à apelação da Procuradoria-Militar e confirmada a sentença apelada.

Foram, a seguir, relatados e julgados os seguintes processos:

APELAÇÃO

37 656 - Rio Grande do Sul. Relator: Ministro Alcides Carneiro. Revisor: Ministro Figueiredo Costa. Apelante: A Procuradoria Militar da 3a.Aud/3a. RM. Apelada: A Sentença do CPJ da 3a.Aud/3a. RM, que absolveu ALCIDES BENNO UTZIG, do crime previsto no art 29 do Decreto-Lei 314/67, em 2 de outubro de 1969.-(JULGAMENTO EM SESSÃO SECRETA).

PETIÇÃO

238 - Guanabara. Relator: Ministro Grün Moss. ITAMAR MAXIMIANO GOMES, condenado a 15 meses de detenção, incurso nos arts 139 e 143 do CPM, por acórdão dêste Superior Tribunal Militar, de 13.5.1968, com fundamento nos arts 340 do CJM e 104 item V, comb com o art 105 VI, do CPM, requer seja decretada a extinção da punibilidade, pela prescricão. - Por unanimidade de votos, foi indeferida a peticão por não haver transcorrido o prazo prescricional. (JULGADO NA 2a. SESSÃO, EM 25-3-970)

No início da Sessão, o Exmo Sr Ministro-Presidente assim se manifestou: "Srs. Ministros; Amanhã, dia 31, transcorrerá mais um aniversário da Revolução e, na 4a feira, dia 1°, o aniversário do Tribunal, que completará 162 anos de existência. Ao ensejo do aniversário do Tribunal, o Rotary Club - Secão da Tijucá - vai oferecer um almôço em regosijo ao Tribunal, pelo transcurso dessa data e, na ocasião, usará da palavra o nosso Ministro Dr Waldemar Tôrres da Costa. Todos os Ministros estão convidados, tendo o Presidente do Rotary Club vindo pessoalmente fazer o convite. Para relembrarem estas duas sugestivas datas, vou dar a palavra ao Ministro Dr Alcides Carneiro, que falará sôbre o aniversário do Tribunal e depois ao Ministro Dr João Mendes da Costa Filho, que falará sôbre a Revolução de 31 de marco."

Com a palavra o Ministro Dr Alcides Vieira Carneiro, assim se expressou: "Senhor Ministro Presidente. Senhores Ministros. - Senhor Dr. Procurador Geral, Esta Casa de Justiça - a mais alta Corte Militar do País, o mais antigo Tribunal do Brasil completa, a 1° de abril, 162 anos de existência. Criado por D. João VI, monarca previdente e lúcido, administrador invulgar, pelo Alvará de 1º de abril de 1808, com a denominação de Conselho Supremo Militar e de Justiça, teve a importantíssima instituição, como seu primeiro presidente, o Marechal D. José de Albuquerque Muniz, Marquês de Angeja e Conde de Vila Verde . Integravam o nôvo órgão quatro Conselheiros do Almirantado, cinco vogais, todos oficiais generais, e três magistrados togados, escolhidos dentre os Desembargadores do Paço, funcionando, um como Relator e os dois outros como Adjuntos. Durante o Império, a jurisdição militar era assegurada pela lei ordinária. Sobrevindo a República, a Constituição de 1891 emprestou o devido relêvo à judicatura castrense, incluindo, como seu órgão supremo, no texto constitucional, o Supremo Tribunal Militar, cuja composição logo após seria alterada, por decreto Legislativo, passando a integrá-lo quinze Ministros, sendo oito do Exército, quatro da Armada e três Togados. Quanto ao Ministério Público Militar, instituição que honra a Justiça brasileira, pela fidelidade à letra e ao espírito das leis e pela disposição de sacrifício no devotamento ao dever, só foi êle criado em 1920, com o Código de Organização Judiciária e Processo Militar. Cresceu, assim, a Justiça Militar, cujo prestígio se completou, ao ser incluída, pela Constituição de 1934, a Côrte Castrense como órgão do Poder Judiciário. A propósito, em substancioso discurso pronunciado nesta Casa, há precisamente cinco anos, dizia o eminente Ministro Vaz de Mello, então nosso presidente, na presença do grande soldado e estadista, que nos visitava, o Marechal Humberto de Alencar Castello Branco, Chefe do Estado. "A Justiça Militar, inteiramente desligada do Comando, como órgão que é do Poder Judiciário, não deixa, entretanto, de estar com aquêle identificada na preservação da ordem e da disciplina das Fôrças Armadas, cuja existência está vinculada à própria existência da Nação, como garantia de sua independência e segurança. Sem uma justiça própria, atuante e inflexível, mas ao mesmo tempo imparcial e humana, em condições de velar pela segurança da tropa na paz e na guerra, e com ela deslocar-se para o teatro de operações militares, as Fôrças Armadas seriam instituições irremediávelmente perdidas, tornando-se precária a independência do Estado, que tem nelas um de seus mais fortes sustentáculos". E conclui: "Não posso deixar de realçar que a judicatura militar nunca faltou ao seu dever; independente e reta nas suas decisões, sempre mereceu o respeito do povo brasileiro, que sente e reconhece o seu silencioso e patriótico trabalho, na esfera jurídica, em defesa da segurança nacional e das nossas instituições democráticas de que tanto nos orgulhamos." Em outra ocasião, reafirma o antigo Juiz, hoje presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros: "Em qualquer das suas instências, a Justiça Militar tem estado à altura do momento e da sua nobre missão, decidindo com independência e retidão os casos sujeitos a seu exame". E nesse exame, dizemos nós, agora, Senhores Ministros, se algumas vêzes erramos, muitas vezes sofremos, embora acertando, o travor das incompreensões, e a incompreensão não deixa de ser uma forma de injustiça. Nem todos se convencem de que nós, juizes, julgamos tão-somente pela prova dos autos, nunca por convicção pessoal, e, nas nossas decisões, não podemos ser mais clementes do que a lei. E é exatamente isto o que distingue a justiça humana da divina justiça. Deus, que tudo vê e tudo sabe, pode julgar por convicação, e Êle, que é a infinita misericórdia, aplica aos violadores das Suas leis os castigos infinitos. O próprio Cristo, que é o símbolo eterno e altíssimo da mansidão e da bondade,  na hora da suprema agonia, só pediu ao Pai que perdoasse aos que não sabem o que fazem. A nós, magistrados, cumpre aplicar as leis, leis feitas pelos outros, sem a faculdade de alterá-las, apenas nos arrogando, em certos casos, a restrita liberdade de buscar intensões, de pesquisar o motivo, o motivo, que é o adjetivo do crime, no conceito lapidar do Mestre Nelson Hungria. Afortunadamente, as decisões que tomamos neste Tribunal, são ajudadas pela experiência, adquirida numa longa e penosa jornada, que caminha para dois séculos. Temos acumulado um fabuloso patrimônio de ensinamentos, acompanhados da dignidade, do equilíbrio, da serenidade, que nos asseguram o respeito e a confiança da Nação. Não somos nós que o proclamamos, como um auto-elogio, ditado pela soberba ou pela vaidade. Assim pensam e proclamam os nossos mais autorizados e mais severos julgadores - os advogados, que aqui vêm com sêde e fome de justiça e aqui encontram a mesma sêde e a mesma fome nos que distribuem essa justiça, com os olhos na lei e a mão no coração, sob a vigilância inarredável da consciência. Há algum tempo, um criminalista de renome. Serrano Neves, membro do Conselho da ordem dos Advogados do Brasil, em luminoso artigo intitulado "A fidalga Justiça Militar", exaltava calorosamente a judicatura castrense. E ainda agora, em bela carta que me dirigiu, assim insiste nos encômios, com sinceridade comovedora: "Cabe-me a orgulhosa satisfação de continuar afirmando que a Justiça Militar é um estupendo exemplo de fé, patriotismo, altivez, de cultura, de dignidade e de fidalguia. É, sem favor, a domus aurea da Justiça Brasileira. Eis o que venho repetindo, através dos tempos, ainda depois de algumas derrotas profissionais, que jamais me desviaram de minha posição histórica em relação a êsse vibrante órgão do Poder Judiciário. As causas que aí tenho perdido, com efeito, são bem estudadas, bem relatadas e decididas com irretocável correção. E o tratamento dispensado aos advogados, sempre atencioso, crescentemente amigo e docemente fidalgo." Ao repetir tão exaltadoras palavras, escritas por um admirável cultor das letras jurídicas, creio, ainda mais, naquela judiciosa sentença de Von Hering: "O Direito é um apanágio do caráter." Senhores Ministros: Em 162 anos de existência, este nosso Egrégio Tribunal, que acolheu em seu sagrado recinto as gloriosas figuras de Caxias e de Tamandaré e a excelsa figura de jurista e homem público que foi o primeiro Ministro da Aeronáutica Joaquim Pedro Salgado Filho, muita coisa viu e ouviu neste mundo e neste Pais. Viu muitas ascensões e muitas quedas, tronos caídos, monarcas derrubados, regimes desfigurados, ídolos decaídos, glórias e tragédias, guerras e vitórias, luzes que se finavam nas trevas das noites, trevas que se diluíam no bojo das auroras. Viu que tudo é efêmero, que tudo é vaidade e que muito certo estava o bardo da Harpa do Crente, quando perguntava: "Orgulho humano, qual és tu mais: feroz, estúpido ou ridículo? E ouviu o eco longinquo da epopéia napoleônica, e de perto escutou os gemidos dos cativos e as hosanas da redenção, quando "desceu da cruz o Cristo chegado do cativeiro", e acolheu, partido do coração de Deodoro, nesse legendário Campo de Santana, o grito da República "sonho dourado do homem feito condor! " Êste Tribunal é, assim, um velho muito vivido, que de nada se espanta e nada vê que já não tivesse visto, que se exorna com os louros do passado e vê com serenidade o presente e aguarda com plena confiança o futuro, porque sabe, por mais que centenária experiência, que êsse futuro não será diferente do passado e será igual ao presente, pois sua deusa é a Justiça, que é imutável e eterna, como primogénita do Criador. Porque sabe que a autoridade que não se deteriora, vence o tempo, e não temem os abismos aquêles que a integridade conduz. Eis porque, não obstante a onda de insônia que varre o mundo, sem poupar esta Terra de Santa Cruz, e, de Continente a Continente afeta e atribula a consciência humana; não obstante êsse desmoronar incessante de mundos e de princípios, o Superior Tribunal Militar segue, impávido e sereno, a cumprir, como é de seu dever, as leis do País e a defender a permanência das instituições, que a todos incumbe resguardar, consagrados que são pelo sentimento patriótico e pelo pendor cristão do povo brasileiro. Ninguém ignora que, nas horas de tranquilidade as circunstâncias se adaptam às leis, da mesma forma que nas horas inseguras as leis se adaptam às circunstâncias, sem o sacrifício da dignidade da pessoa e dos seus direitos impostergáveis, conquistados, na marcha do tempo, de geração em geração, à custa do suor e do sangue de apóstolos, de mártires e de heróis. É notório, é indisfarçável, que estamos vivendo horas de intranquilidade, e, por tudo o que vimos e a que assistimos em 162 anos de existência, a missão de todos os bons patriotas, sobretudo dos incontaminados juízes brasileiros, é impedir que as chamas rebentadas das tôrvas idéias e das ambições irrealizáveis, ganhem o capinzal sêco dos ódios vesânicos e se alastrem nas sarças inflamáveis das tenebrosas paixões. Eis o grandioso destino desta velha Casa de Justiça, em que se irmanam militares e civis, no esfôrço comum dos julgamentos corretos, e onde, parodiando o condoreiro dos "Escianos", não cora a balança de ombrear com a espada nem cora a espada de chamar-lhe irmã. Seja ela eternamente digna dêsse destino, a julgar sempre com elevação, sabedoria e firmeza, merecedora sempre daquela divisa que um dia imaginei a figurar no pórtico dêste majestoso Templo de Justiça para ser vista e reconhecida por todos os brasileiros - "Deus é teu direito".

A seguir, usou da palavra o Ministro Dr João Mendes da Costa Filho, assim se expressando: Sr. Presidente, Srs. Ministros. Sr. Procurador da Justiça Militar. Cumpro a honrosa incumbência de, em nome dêste Colendo Tribunal, homenagear o movimento democrático, vitorioso a 31 de março de 1964, quando são decorridos seis anos do dia em que o povo brasileiro marcou pela ação patriótica das nossas Fôrças Armadas, a prevalência do direito, da liberdade, da ordem, da disciplina, da moralidade administrativa sôbre a ilegalidade, a licenciosidade, a anarquia, a indisciplina, a corrupção, o cáos, sem que tivéssemos a deplorar o derramamento de sangue de patrícios, mesmo daqueles que não vacilariam em cortar as nossas cabeças se houvessem conseguido vencer-nos. Não me permitirei deslembrar que a minha palavra, nesta hora, é a de um magistrado, falando em nome do seu Tribunal, atento à circunstância de haver sido decidido lutador ao lado dos que salvaram o Brasil do opróbrio em que o tentavam afundar a situação deposta. Aliás, no meu discurso de posse, neste venerando Tribunal, adverti que recusaria a honra de ocupar uma de suas cadeiras se o cumprimento da missão de Juiz colidisse com o direito, sob qualquer título inalienável, de manifestar meu pensamento. Todavia, não há ambiente mais próprio para exaltar a Democracia, condenando a subversão, do que a Casa da Justiça, pois cumpre ao Poder Judiciário, como aos demais Poderes da República, guardar o Regime consagrado na Constituição. Dois chefes revolucionários, dois grandes soldados, mas dois grandes civilistas - Marechal Humberto de Alencar Castello Branco, o austero, Marechal Arthur da Costa e Silva, o generoso, a cujas memórias rendemos a nosso comovida homenagem, dignificaram seus mandatos e provaram ao mundo, pelo exemplo, que, ao contrário do que tem, malevolamente, divulgado a imprensa estrangeira, desonesta ou tendenciosamente informada, o Brasil repele gôvernos militaristas. Os seus presidentes militares, notadamente os dois últimos, considerando as circunstâncias em que governaram, timbraram pelo exercício do mais lídimo civilismo. As Fôrças Armadas, repetidas vezes, foram obrigadas a interferir na vida política do Pais, sempre, porém, no cumprimento da missão que lhes é reservada pela nossa Lei Maior, jamais se havendo aproveitado dêsse dever constitucional para instalar governo militarista. Tudo fizeram os dois primeiros mandatários do regime democrático reinstalado no Brasil pela Revolução, para serem fiéis guardiães daqueles princípios, que os levaram a tomar posição ao lado dos que deliberaram repôr o País no sistema de govêrno da vocação e do destino do povo brasileiro. Dois grandes presidentes, dois honrados administradores, dois bravos patriotas, nem sempre bem compreendidos, mas nunca postos sob suspeita da traição aos ideais do movimento redentor, cujo sexto aniversário estamos a comemorar hoje. Não se pode acusar êsses dois ex-chefes da Nação da desrespeito ao Poder Judiciário. É preciso considerar-se que presidiram a República numa convivência incômoda e difícil dos Poderes Judiciário e Revolucionário. Foram suficientemente fortes para suportar atitudes de alguns magistrados que contestavam, em seus pronunciamentos, a Revolução sob cujo império vivia e ainda vive o País. E êsse estado de Revolução, tanto poderia, como ainda pode, conduzir à restauração e aperfeiçoamento da ordem democrática, como ser arrastado, pela insensibilidade política, às reações da fôrça e, conseqüentemente, ao descalabro da ditadura, para defender-se de uma contra-revolução, objetivando o retôrno do Brasil à calamitosa situação deposta a 31 de março de 1964. A propósito ouçamos a palavra sábia do mestre Carlos Maximiliano: "Conquanto diversos o fenômeno jurídico e político, jamais será possível separá-los. A hermenêutica e a aplicação do direito precisam inquirir qual a norma que melhor corresponde não só às exigências da Justiça, como, também, às da utilidade social. Jamais prescindem do elemento político, índice das novas necessidades, novas condições e novas relações. Dentro da letra expressa da Lei cumpre ao Juiz procurar a interpretação que conduza à melhor consequência para a sociedade. O excesso de zêlo pela juridicidade é contraproducente; afasta-se do objetivo superior das Leis, desvia. o Pretório dos fins elevados para que foram instituídos." A ordem jurídica que cumpre à justiça resguardar não se nutre da demagogia, não mergulha as suas raízes no terror, na corrupção, no facciosismo. Diante de uma situação como a que determinou a atitude das nossas Fôrças Armadas, a 31 de março de 1964, em perfeita consonância com a vontade do povo brasileiro, a posição do juiz terá que ser a da defesa do Regime, sem transigências oriundas do mêdo, ou de outras fraquezas, contra os que juram a morte das Instituições Livres e o aniquilamento da nossa organização social. Não se queira emprestar a êstes conceitos o sentido de submissão do Juiz ao Poder. A ninguém importa mais do que ao Magistrado fugir ao mêdo, esquivar humilhações e não conhecer covardia, conforme a palavra oracular de Ruy. O que, precìpuamente, cumpre a qualquer brasileiro, esteja em que posição estiver, é a defesa dêsse inestimável patrimônio, sem o qual a vida não faz sentido, em que os valores morais são respeitados, em que a evolução do conceito de liberdade não implica na mutilação da dignidade da pessoa humana. Vivemos uma época em que a inteligência se superpõe à consciência e, certamente, por isso, a inquietação angustía o mundo, estabelecendo o choque entre uma geração aflita e perplexa e outra insatisfeita e rebelada. Disso aproveitam-se os falsos apregoadores do bem social para exterminar o equilíbrio entre o passado e o presente, estimulando essa guerra de gerações, em que filhos já matam pais pelo ódio gerado ao influxo dos choques de comportamento- Mas, é certo que os princípios de direito, as normas de justiça, a concepção do bem se transformam no cadinho do tempo, enquanto no cérebro dos homens exponenciais de cada época forjam-se os moldes de conduta humana, que visem a um mundo melhor. Sabemos que essa onda de loucura que se atira contra a humanidade passará, mas nós, democratas e homens de sensibilidade, não devemos seguir o exemplo da avestruz. Não temos o direito de ficar indiferentes ante o duro embate entre os deveres da dignidade e a rebeldia da perversão. A Revolução de março de 1964 tem conseguido incontestáveis vitórias no campo econômico-financeiro. Saimos de uma dramática inflação para suportável taxa inflacionária, que decresce cada ano, enquanto se acelera o ritmo de desenvolvimento do País. A austeridade no trato da coisa pública aboliu aquela bacanal de empreguismo, malversação dos dinheiros do Estado, anarquia salarial... A guerra à corrupção não tem cessado. Seria temerário asseverar que o mal crônico haja sido extirpado por completo, mas o certo é que os corruptos, porventura existentes na vida pública do País, estão sem liberdade de movimento. A subversão perdura, porém com outras características. Sob o govêrno deposto a 31 de março de 1964 ela era fomentada pelos próprios órgãos governamentais. A indisciplina dominava os quartéis, estimulada pelo Comandante em Chefe das Fôrças Armadas, que, degradando o pôsto de Supremo Magistrado da Nação, chegou ao ponto de participar de reunião, altamente subversiva, de sargentos obedientes à liderança comunista e que se propunham a implantar no Brasil uma república socialista. A segurança nacional não era objeto de cogitação ou, por outros têrmos, não se tomava conhecimento de que no Brasil havia uma Lei de defesa do Estado. O que seria crime contra a segurança nacional passou a ser ato legítimo, que credenciava o seu autor ao aprêço do govêrno, de cujo palácio se servia a subversão para seu quartel general. As Fôrças Armadas do Brasil provaram ao Mundo que o nosso País saberia repelir, como veio a fazê-lo, a artificial situação, sem consistência, porque sem apoio popular e em choque com o caráter, o espirito, a vocação e o destino de nossa gente. Bastou que o povo saísse às ruas, numa grande manifestação de repúdio a tal govêrno, dando certeza às Fôrças Armadas que, ao cumprirem sua missão constitucional de garantir a ordem democrática, contariam com o respaldo da opinião pública, para, sem um tiro, a disciplina voltar aos quartéis, a dignidade ao Poder, a tranquilidade aos lares brasileiros. A subversão que ora intranquiliza a família brasileira não é aquela alimentada pela demagogia janguista, pelas bravatas brizolistas, pela agitação de falsos dirigentes sindicais, pelo exibicionismo de imaturos pseudo lideres estudantis, pelas idéias político-sociais mal digeridas por alguns despreparados inferiores, pela senilidade ou pela ambição de uns poucos oficiais das nossas Fôrças Armadas. Trata-se agora, de coisa séria. Estamos sofrendo os efeitos de uma guerra revolucionária, que tem seu alto comando além fronteiras. Não há negar que a guerrilha urbana no Brasil chegou a sua fase quasi plena: ataques a quartéis com roubo de armas, assalto a Bancos para obtenção de fundos (o que já se tornou rotina), fuzilamento de sentinelas nos seus postos de serviço, seqüestro de representantes diplomáticos para obtenção da impunidade de perigosos terroristas, desvio de aviões de suas rotas normais para Cuba, trampolim de que se serve o comunismo internacional para seu planejado assalto à América Latina. Não obstante evidentemente grave a situação do Brasil no que se refere à segurança pública, com a audaciosa atuação do terrorismo, não há porque duvidar da ação, afinal vitoriosa, da autoridade. A guerrilha só consegue êxito onde conta com o apoio da população. Isso não sucederá no Brasil. O povo brasileiro é, por tendência natural, infenso ao crime organizado, à traição como meio de chegar-se a objetivo, até mesmo licito, ao latrocínio como forma de obter dinheiro, ainda que para destinação honesta. Mas, acima de tudo, o povo brasileiro não sabe viver sob regime totalitário. A liberdade para êle é o maior dos bens. Não o seduz a mensagem dos guerrilheiros. Repetindo Ruy, dizemos que êle "vive da persuasão e esperança, benignidade e trabalho. Não é do seu seio que sai a Mão Negra das desforras anônimas". A lei brasileira vincula tôdas as pessoas físicas ou jurídicas à defesa e conservação da segurança nacional. Todos os habitantes do Brasil, por consequência, têm a obrigação legal de participar do combate à subversão. Conforme está advertido na Nota de Instrução nº 1/68 do EME, a guerrilha urbana é a atual experiência-teste do movimento comunista internacional, de suas Frentes e de outros grupos ideológicos para implantar a subversão nos países democráticos, com o objetivo de derrubar os govêrnos e assumir o Poder. Trata-se de organização e planejamento obedientes a uma perfeita técnica e de tal forma eficiente na sua execução que podemos afirmar ser impossível debelar o mal sem que o povo, não apenas para obedecer à Lei, mas ao apêlo dos seus sentimentos democráticos e cristãos, coopere com a autoridade na luta pela salvação do Regime. É preciso sejam reacesas as chamas daqueles mesmos ideais que nos deram a vitória de 31 de março de 1964. Os perigos que rondaram as Instituições Democráticas nos ominosos tempos do comunismo-peleguismo cederam lugar aos da guerra revolucionária, que, na sua ação insidiosa, saberá usar a descrença dos fracos, as decepções dos ambiciosos, o despeito ou a revolta dos marginalizados, a inconformidade dos injustiçados, a inquietação dos eternos conspiradores....Tôda revolução comete injustiças, provoca decepções, semeia inimigos. A nossa, de 1964, não teria fugido à regra. Assim, todo êsse tipo de gente estará disposta a servir a subversão, quando mais não seja, de massa de manobra. A guerra revolucionária que o País enfrenta não é um fenômeno brasileiro. Não nos esqueçamos de que, aproximadamente, um têrço da raça humana vive, mais ou menos, agrilhoada ao comunismo internacional. O Brasil é uma das mais visadas prêsas do Poder comunista. Não temos o direito, nem isso permitiriam os nossos brios de Nação Soberana, de esperar que sejamos defendidos por potência estrangeira, que nos queira tutelar, tanto mais quanto a experiência com outros povos já nos ensinou que os êrros acumulados, desde a Conferência de Ialta, nos autorizam a desacreditar numa racional, honesta e eficiente ajuda. A Democracia em perigo reclama a união de todos os homens livres dêste País. Que os malentendidos, os ressentimentos, as desconfianças, as incompreensões desapareçam e voltem nos seus espíritos aquêles mesmos ideais, aquêle, mesmo ânimo de luta, aquêle mesmo patriotismo que possibilitaram a vitória da Revolução hoje comemorada. Que atendam ao chamamento da Pátria. É uma convocação que não admite recusas. Estejamos unidos, soldados e civis, homens e mulheres, pretos e brancos, jovens e velhos na defesa do patrimônio comum a honra da Nação e o Regime que ela consagra na sua Magna Lei. Já fui político, servi como soldado de linha de frente das fôrças revolucionárias. Hoje sou Juiz. O meu comportamento há de cingir-se aos deveres e à austeridade da Justiça. Pertenço a um Tribunal que, através de 162 anos de profícua atividade judicante, se impôs ao respeito da Nação, pelo seu culto ao Direito e à Justiça. E é em nome dêsse venerando Tribunal, o decano dos Tribunais do País, que falo para homenagear a quantos, ostensiva ou anônimamente, deram a sua contribuição para a vitória de 31 de março de 1964. Ao fazê-lo não posso omitir o nome daquele a cuja decisão se deve, em grande parte, essa vitória, atentando para a circunstância de haver sido integrante do corpo de Juízes desta Colenda Côrte e seu presidente. Chefe revolucionário, ou Ministro dêste Egrégio Tribunal, o patriotismo, a honradez, a inteligência, o amor ao trabalho, postos a serviço de seu País, fizeram-no credor da estima e da gratidão do povo brasileiro - General de Exército e Ministro Olympio Mourão Filho. E qual será o nosso dever para com a Revolução, que mereceu a presente homenagem, ao ensejo do sexto aniversário de sua vitória? Nada mais do que cumprirmos a nossa missão de Juiz, segundo o conselho do mestre Ruy; corajosos no decidir, não sermos daqueles magistrados nas mãos de quem os autos penam como as almas do purgatório, não nos transformarmos de julgadores em verdugos, não receiarmos soberanias da Terra, nem a do povo, nem a do Poder, não cortejarmos a popularidade, não transigirmos com conveniências. Muita vez, aparentemente, contrariamos a Revolução, absolvendo notórios comunistas. É que a nossa legislação não pune quem professe ideologia, seja qual fôr, mesmo contrária ao nosso Regime. Ao revés disso, a Constituição Brasileira diz que "por motivo de convicção filosófica ou política ninguém será privado de qual quer dos seus direitos". Outras vêzes a absoluta ausência de prova obriga-nos a absolver indivíduos denunciados por subversão, isso porque ao juiz é vedado condenar sem a configuração do delito e de quem seja seu autor. Daí a incompreensão para com êste Tribunal, por parte de certos "zelosos revolucionários", que se atribuem o direito de julgar nossas decisões. Compreensivos para com êles, levamos o leviano julgamento à conta de desinformação das coisas da Justiça. O Superior Tribunal Militar é um órgão do Poder Judiciário, a quem cabe aplicar contenciosamente a Lei a casos concretos, na área de sua competência, assegurando, com seus pronunciamentos, a soberania da Justiça. É confortador para os juristas que integram o S.T.M. repetir as palavras de um General de Exército, que honrou esta veneranda Côrte, dela fazendo parte. Refiro-me ao saudoso e ínclito Ministro Tristão de Alencar Araripe: "O direito de sobrevivência nacional cria deveres e impõe novo conceito aos postulados da liberdade humana. As restrições impostas às liberdades individuais pelo Poder do Estado - como é corrente nas democracias mais liberais do mundo - nos casos de emergência - fogem dos modelos totalitários, desde que se fortaleça o consenso da contribuição de todos para que a Comunidade sobreviva. Só o direito e a lei, soberanos, poderão estabelecer o necessário equilíbrio para que subsista a grandeza humana".

A seguir, o Dr Nelson Barbosa Sampaio, Procurador-Geral da Justiça Militar, assim se manifestou: "Sr. Presidente. Srs. Ministros. Dois grandes acontecimentos estamos hoje comemorando: os aniversários da Revolução e o do Tribunal que, completa 162 anos de existência. Depois das fulgurosas palavras proferidas pelos Ministros Drs. Alcides Carneiro e João Mendes, sôbre êsses dois acontecimentos, nada tenho a dizer, desejando apenas me associar, em meu nome e no do Ministério Público às palavras proferidas por ambos os Ministros".

Pediu a palavra, pela ordem, o Ministro Gueiros Leite, assim se expressando: "Sr. Presidente. Srs. Ministros: Quero me congratular com as datas natalícias do Tribunal e da Revolução e aproveitar a oportunidade para pedir a V.Exa. que faça registrar em Ata a referência que fêz o Ministro João Mendes sôbre a pessoa do nosso colega e Ministro Mourão Filho, dando conhecimento a êle que na data em que se comemora o aniversário da Revolução, o Tribunal houve por bem aprovar um voto de contratulações à sua pessoa pela participação naquele movimento democrático". O Tribunal aprovou a proposta por aclamação.

A Sessão foi encerrada às 14.45 horas, com os seguintes processos em mesa:

HABEAS-CORPUS

30.164(CM)

CONFLITOS DE JURISDIÇÃO 186(CM) - 183(WT)

REPRESENTAÇÃO 928(FC) - 925(AC)

CORREIÇÃO PARCIAL 943(TU)

PETIÇÃO 237(FC) - 241(AC)

RECURSOS CRIMINAIS:

4 447(WT)

4 435(WT)

4 424(WT)

4 433(AC)

4 450(AC)

4 449(AC)

4 439(AC)

4 423(AC)

APELAÇÕES:

36 988(GL/TU)

37 687(AC/SM)-2a.Aer 1471

37 691(TU/WT)-2a./8a. 8

37 730(FC/AC)-1a./1a. 1

37 813(FC/AC)-2a./1a. 2

37 602(AB/JM)

37 633(AC/SM)